Figuras

Esta série das “Figuras” está muito ligada, seja no conceito, tema, mas também na técnica, à serie “Corpos”, que era constituída por figuras de mulheres a preto e banco, e apenas remotamente ligada à serie à serie “Elas”.

Chego agora à conclusão que, de vez em quando, parece que tenho que fazer uma interrupção nas minhas pinturas de muros e paredes, que são bastante matéricas, urbanas e violentas, em que o uso das técnicas mistas está muito assumido com colagens e objectos. E quando faço essa interrupção como que “me viro” para imagens mais tradicionais da pintura, assumidamente bidimensionais e claramente figurativas, utilizando aguadas que tornam as figuras mais transparentes, mais misteriosas… De perto ninguém é normal, mas ao longe, no meio atmosférico, ficamos reduzidos a vultos…. Acho que estas figuras, porque não completamente definidas, levam quem as vê a querer construir uma história sobre a figura que se está a ver. Nessa medida a eventual “narrativa” que o quadro/figura possa envolver como que é “transferida” para o observador. A ausência de rostos, ou de rostos definidos, bem como a aridez dos títulos, ajudam a esta “devolução” da construção de uma personagem (de uma história) para a figura que está a ser observada, (alguém falou em “possibilidade de leituras múltiplas”).

Por último, e uma vez mais invocando esta fase de “interrupção” da minha obra normal, aqui não vou buscar ao mundo coisas que já existem. Não vou roubar fotografias, cartazes, grafittis, sinais ou objectos. Não vou buscar referências à história da arte, nem ao acervo cultural de que somos feitos. Crio do zero (como um deus) criaturas. Se crio coisas doces ou terrificas, se crio coisas belas ou perturbadoras, se todas ao mesmo tempo, não sei… quem olhar que o diga.